26 de mai. de 2011

O Presbítero Kiga

O texto abaixo foi escrito pelo P. Renato Becker e publicado originalmente no portal Luteranos. Vale a pena a leitura e a descoberta de que "o que vale mesmo são os relacionamentos".

O Knyga Boek e eu somos amigos desde infância. Estudamos juntos no Colégio Mauá lá pelos idos de 1966. Esses dias eu fui tomar um café no Jerke, na nossa Rua João Collin. Surpresa! O “Kiga”, como o chamávamos estava ali, sentado à mesa, comendo uma empadinha recheada de palmito e camarão. Fui logo quebrando sua solidão:

- Grande Kiga!

O meu amigo me olhou de lado, reformatou seus pensamentos e logo se levantou para me dar um abraço. Tinham-se passado quarenta e cinco anos. Nossos cabelos tinham embranquecido; nossos cérebros tinham evoluído, mas a nossa amizade se mostrava igual à dos anos sessenta.

- Muitas vezes lembrei-me de ti amigão. Outro dia descobri no Google que estás pastor. Não tinha me dado conta que pastoreavas uma Igreja aqui em Joinville. É da nossa IECLB? Ih rapaz! Acho que vais gostar de saber: Sou presbítero lá na nossa cidade.

- Uaauuu... Veja como são as coisas. Presbítero da Igreja do nosso querido pastor Werner... Que bom ouvir isso Kiga. Fale-me mais de você...

- Hoje sou representante comercial. Estou quase me aposentando. Vim até esta cidade industriaria para comprar material hidráulico e com isso abastecer a minha loja. Meus filhos já tomam conta da mesma lá em Santa Cruz do Sul. Casei com a Nilce. Lembra dela?

- Mas claro que sim. Era aquela menina moreninha que sentava bem na frente do “seu Bender”, o dono daquela DKW cinza.

- Isso mesmo! Mas e tu Renato? Como vai a vida por aqui?

- Amigo velho! Às vezes carrego a impressão que não vou mais conseguir respirar no meio desta “correnteza”.

- Tá todo mundo correndo Renato. Uns têm prazer em fazer o que fazem; outros dão “duro” porque precisam do emprego para sustentar suas vidas; muitos dão de si porque querem ajudar a construir uma sociedade mais justa. Já tu e eu fazemos as coisas que fazemos sempre pensando em estar servindo ao nosso Criador. Te confesso que agora, dizendo o que eu disse, fiquei com saudades do saudoso pastor Rempel.

- É! O pastor Benno Rempel era um pastor legal. Rapaz! Ele me ajudou muito. Sabias que o filho dele, o Carlos, é ligado aos esportes na cidade de Santa Maria. Jogava vôlei como ninguém...

- Claro que eu lembro. Mas Renato, você sabe isso melhor do que eu: A Bíblia diz que “o nosso trabalho nunca é vão”.

- Sei disso Kiga... Mas se a gente olha em volta, logo percebe que são muitas as pessoas que se queixam de que todo o seu esforço sempre acaba dando em nada. Vai daí estas mesmas pessoas se sentem inúteis e entram em depressão.

- Isso também acontece dentro da Igreja... Olha! Eu já experimentei desânimo lá na Comunidade da nossa terrinha. Às vezes esta falta de vontade se mostra como uma verdadeira “assassina” da minha disposição; da minha esperança; da minha alegria. Nestas horas eu perco a vontade de me engajar nos projetos de vida que se mostram do meu lado. Sério! Muitas vezes fico com vontade de “jogar a toalha” porque nada dá certo e ou porque me sinto “sugado” pelos que esperam algo de mim.

- Oh Kiga! Foi você mesmo que lembrou a palavra do apóstolo Paulo: “No Senhor o nosso trabalho não é vão!” (1 Coríntios 15.58). Se o teu falar; o teu pensar e o teu agir estiverem focados em Deus, então Deus te orienta; te dá forças; te dá resistência.

- Eu sei Renato. Deus não me deu “espírito de covardia, mas de poder, de amor e de moderação.” (2 Timóteo 1.7 ) e é por isso que posso “fincar o pé”. É ruim esse sentimento que sempre temos que estar produzindo para sermos aceitos pelos outros. Também podemos louvar a Deus com nosso recolhimento.

- Certo Kiga! Mesmo que as nossas atividades sejam cansativas e sem graça; difíceis de serem avaliadas como “produtivas” e aparentemente sem sentido, “no Senhor, nada é em vão”. A bênção de Deus está lá onde se faz as coisas no Seu santo Nome, seja no comércio; seja na indústria; seja na Igreja.

- Pastor Renato! Agora preciso ir. Quando visitares tua mãe, dá um grito e vem lá na nossa casa. Prometo que vou te assar uma boa costela para comemorarmos; festarmos a nossa vida.

Abraçamo-nos longamente. Entrei no carro da Paróquia e fui pra casa. Eu guiei, mas meus pensamentos estavam condensados no fato de que o que vale mesmo são os relacionamentos.

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